
Teixeira Cândido é conhecido por ser um defensor ferrenho da liberdade de imprensa. Na semana em que o secretário-geral do Sindicato dos Jornalistas Angolanos (SJA) anunciou a primeira marcha pública da história da classe em Angola, em repúdio a actos de intimidação contra jornalistas, TC falou, em entrevista ao NJ, sobre outros temas de interesse da classe, particularmente a «vida» do Sindicato, como a quotização, os salários dos funcionários e o fim do seu mandato.
Fala-se muito do exercício do Jornalismo e pouco se aborda sobre as condições sociais dos profissionais. Como é que estamos nesse capítulo?
Nos media públicos, as quatro empresas [TPA, RNA, ANGOP e Edições Novembro, do qual faz parte o Jornal de Angola] já resolveram a questão da Segurança Social e, no privado, dois ou três também têm a questão resolvida, mas todos os outros têm uma grande dívida, de modo que não permite que os seus profissionais vão para a reforma. A situação é geral, há uma dívida enorme com os profissionais, o próprio serviço não dispunha de mecanismo coercivo para a cobrança da Segurança Social. As empresas estavam apenas sujeitas a pagar multas. O que nós entendemos é que os trabalhadores devem intentar acções, para que as empresas paguem a Segurança Social, porque nós somos descontados quando somos pagos. Não faz sentido que, depois de ter cumprido 30 anos de trabalho ou atingindo 60 anos de idade, não possa gozar de descanso, pois a entidade patronal deixou de pagar a reforma. Portanto, a situação é grave a nível dos órgãos de comunicação social. Essa questão é importante. A nossa perspectiva é, nos próximos dias, reunirmos todos os colegas do sector privado para um encontro alargado, no qual vamos traçar uma agenda, a fim de abordarmos a questão das carreiras nas empresas privadas.
Há um projecto do Sindicato dos Jornalistas para a reforma complementar dos seus membros?
O que, na verdade, estamos a fazer é o seguinte: estamos a trabalhar nas carreiras profissionais das pessoas, porque, para a nossa realidade, sem carreiras profissionais, não há como depois no final a pessoa ter uma pensão para pagar, uma vez que, para se ter uma reforma para pagar, impunha termos contribuições dos colegas. Ora, e qual é o grande problema? Nós temos, nos órgãos de comunicação social, colegas que estão há 10 ou 15 anos e o salário, por exemplo, não melhora. Se não forem responsáveis, não há carreiras nas empresas. Não havendo carreiras, não tem como haver progressão, e não havendo progressão, ficamos completamente condicionados para estabelecer este sistema complementar. Nós ainda não avançamos, visto que os nossos salários são paupérrimos, não temos carreiras, então estamos a trabalhar nessa perspectiva, de fazer que as empresas todas estabeleçam carreiras, para permitir que os profissionais possam ter melhores salários quando atingem os últimos escalões profissionais e, a partir daí, sim, podemos ter, então, este sistema complementar. Enquanto isso não acontecer, será muito difícil.
Como está o SJA em termos de membros e quotização?
Nós estamos, nesta altura, com pelo menos mil colegas a pagarem, mas o SJA tem pelo menos três mil associados que não pagam. É verdade que, hoje, comparativamente aos anos anteriores, há mais vontade. Temos membros que não têm problemas de pagar, adiantando três a quatro anos de quotas, mas a grande maioria ainda não paga.
Qual é a quantia?
Nos termos dos Estatutos do SJA, a quota paga por cada membro é de 1% do salário de cada profissional. Na verdade, tínhamos uma quota transitória, que era de mil kwanzas, mas, no último congresso, aprovou-se aquilo que estabelece a Lei Sindical, segundo a qual "a quota vai de 1 a 3%". Como sabem, nós não temos grandes salários, adoptámos o 1% para permitir que, por exemplo, quem ganha 50 mil Kz possa pagar, por exemplo, 500 kwanzas, para permitir que cada um pague à medida do próprio salário, para não haver aqui alguma desigualdade. Por isso, adoptámos, em Agosto último, o desconto que a lei estabelece.
Os funcionários do SJA são assalariados?
Nós somos jornalistas, e quem defende a dignidade não pode não assalariar. Pelo menos os três colegas que trabalham connosco na área administrativa, que não são jornalistas, são assalariados. Agora, nós, da direcção, não [somos assalariados], apesar de o Estatuto prever um subsídio para o secretário-geral, que é de 3% da quota, o equivale a 45 mil kwanzas, mas, por falta de condições, ainda não implementamos. Vamos implementando, de vez em quando, para combustível, para comunicações, mas os membros de direcção não têm salário. Infelizmente, o SJA só depende de quotizações.
No ano passado, o Executivo mostrou-se indisponível a prestar qualquer ajuda à imprensa privada. Não se prevêem outras movimentações nessa perspectiva?
Nós temos a nossa função, que é, obviamente, pressionar os órgãos competentes, porque é de lei este incentivo à imprensa. Portanto, não é um favor, é de lei. A Lei de Imprensa estabelece que o Estado deve adoptar um conjunto de incentivos para a comunicação social, exactamente porque o Estado tem o dever, de acordo com a Constituição, de promover a diversidade dos órgãos de comunicação social e a pluralidade da informação. Entretanto, só é possível promover a diversidade de órgãos se coexistirem órgãos públicos e privados. Como sabe, a principal receita dos órgãos privados é a publicidade e, não havendo publicidade, a situação agrava-se, já que, segundo a UNESCO, grande parte da publicidade que era para os órgãos de comunicação social convencional está a ser encaminhada para as redes sociais. Esse apelo foi feito pela UNESCO no dia 3 de Maio deste ano, na sua Jornada Mundial da Liberdade de Imprensa, que ocorreu no Uruguai, onde fez o apelo aos Estados e às fundações para que apoiem o Jornalismo convencional, a fim de não desaparecer nem comprometer a nossa democracia. Temos duas realidades: por um lado, é uma realidade global, em que os grandes órgãos estão a desaparecer, e por outro, é a realidade local, onde, actualmente, temos apenas dois órgãos impressos privados a sobreviver, quando, há alguns anos, já assistimos à circulação, no nosso País, de mais de 20 títulos, onde os leitores, aos fins-de-semana, tinham dificuldades em escolher o que comprar. Hoje, apenas dois títulos "fazem a sala", com a lei dos incentivos há mais de 30 anos a aguardar que seja implementada. Estamos perante uma situação dramática, que devia preocupar não apenas a nós, jornalistas, mas também ao Estado, a quem a Constituição impõe o dever de garantir a diversidade de órgãos.
Mas existe algum plano a nível do SJA para uma nova frente, a fim de exigir do Executivo este incentivo?
Pensamos em voltar a abordar a 7.ª Comissão da Assembleia Nacional: Se há aqui uma omissão na regulamentação da lei e quem aprova a lei é a AN, então a Assembleia Nacional não se pode calar. Há aqui um desrespeito à lei aprovada pela Assembleia Nacional, que dura 30 anos. Nós tínhamos feito já esta tentativa em 2020, no auge da crise, escrevemos a Sua Excelência Presidente da República e tivemos uma primeira abordagem. Numa espécie de luz verde, o então ministro do sector abordou-nos, dizia que havia da parte do Presidente da República esta predisposição para se implementar este incentivo. Subitamente, na realidade, depois de muito tempo, já ninguém nos diz nada, e aquilo que era uma autorização acabou por não ser mais uma autorização. Vamos, na próxima semana, solicitar à 7.ª Comissão uma audiência, não apenas para abordar esta questão, mas também para falarmos da liberdade de imprensa.
O Executivo tinha prometido privatizar os órgãos de comunicação social recuperados, facto que não acontece até agora, sendo que a liberdade editorial destes órgãos há muito que é alvo de críticas, por alegadamente estar ao serviço do poder político. Quais são as formas de pressão para que esses órgãos sejam privatizados ou ganhem uma liberdade no exercício do Jornalismo?
Estamos preocupados com o silêncio da Entidade Reguladora da Comunicação Social (ERCA), porque, nos termos da Lei de Imprensa, artigo 25.º, a lei proíbe qualquer tipo de monopólio e, neste momento, o Estado está com o monopólio da televisão. Decorrido o período de privatização, passados quatro ou cinco anos, não faz sentido que o Estado nada diga em relação a isso, quando se está a priorizar, por exemplo, a privatização de outras empresas não ligadas à comunicação social. Por imperativo legal, o Estado não pode continuar detentor destes canais de televisão. Neste caso, o Estado é o único detentor de televisões. Agora, surgiu, é verdade, a Rede Girassol. Não se conhece, ao certo, quem são os proprietários, que, na realidade, é outra situação que a ERCA devia pronunciar-se, porque, segundo a Lei de Imprensa, os proprietários dos órgãos de comunicação social, ainda que sejam empresas que tenham a natureza de sociedade anónima, devem ser do conhecimento público. É isso que estabelece a lei, mas, se a ERCA nada o fizer, a nós competirá fazer essa pressão pública, visto que nos interessa que estejamos num mercado que utilize a transparência. Interessa-nos que haja concorrência, liberdade e o mínimo de responsabilidade dos órgãos de comunicação social.
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